Selva de Pedra (nem tanto)

Terça-feira e eu perdida na selva de pedra chamada São Paulo, para visitar a Bienal 2010 (que encerra no próximo sábado) e outras exposições em galerias e museus. Respirar um pouco de cidade grande, de gente por todos os lados, engarrafamentos gigantescos (que nos fazem calar em relação ao trânsito daqui). Água, chuva, temporal, cinza dos prédios, arte das cores dentro dos prédios. Gente diferente (ou gente sempre igual), passos apressados, olho no relógio, sem respirar. Respiração acelerada, sem sentir, sem fazer, sem se dar conta que quando olhar novamente o relógio, os ponteiros giraram rapidamente, o dia andou, o presente virou passado, o momento não foi aproveitado, o olho no cifrão foi mais ganancioso e algum tempo delicioso foi perdido em vão (em vão não, os dígitos da conta bancária agradecem), mas a selva continua a mesma e os animais enjaulados, acuados, ditos civilizados porque são da grande metrópole e o mundo gira ali. Pretensão. Prefiro a liberdade do pequeno paraíso, mesmo quando a minha janela teima a emperrar e chove também pelas bandas de cá. Pretensão mais uma vez, como se todos pensassem da mesma forma e almejassem a mesma liberdade ou não permanecerem presos no próprio eu. Melhor assim, pois de melodia desafinada e cabeça desalinhada basta um exemplar. Melhor falar de arte, porque de gente ainda estou para entender. Difícil. Às vezes, eu não me entendo, quem me dera (e quisera) entender alguém. Fica por isso mesmo, aproveite os atos, esqueça os fatos. Rir ainda é um bom remédio (não a solução). E, na Bienal é permitido rir, sorte essa, pois existe gente que, na correria mecânica do dia, já não se permite mais esse prazer. Nunca vi tanta cara sisuda. Já suspeitava (e agora tenho certeza), a brisa da praia nos deixa mais leves e o azul profundo brilha nos olhos de quem passa por aqui. Cheiro de mar, gosto de lembranças. Sabor doce de saber levar a vida, apesar de todas as obrigações e compromissos, desculpas que não agüento mais ouvir (todo mundo comprou o mesmo disco ou a agulha emperrou). Uma hora se percebe que a pressa leva ao mesmo lugar, um pouco mais rápido talvez, porém, o coração e o olhar perdem certos instantes, capazes de mudar todo o fim. Escolhas, sempre as escolhas (e as dúvidas). Certos ou errados, os ponteiros do relógio continuam a correr, e cada vida toma seu rumo (poeticamente ou não). Nesse momento, o que me conforta são as palavras de Nietzsche, “existe a arte para que a realidade não nos destrua”. E a arte invadiu não somente a Bienal, também invadiu os jardins do Ibirapuera. Além disso, boas exposições podem ser apreciadas na Oca e no Mam (Museu de Arte Moderna), tudo ali juntinho, no meio do verde (você esquece que a selva é de pedra) e com direito a uma boa dose de cafeína. Inspiração. Degustação. Arte. Prazer. Liberdade. Sonho. Poesia. Felicidade. Para que mais? (infelizmente – ou felizmente, dependendo do ponto de vista, sempre se quer mais). Água na Oca é uma ótima exposição para se visitar e se conscientizar de sua essencial importância. Interativa, didática, falar da água é como falar da vida. E as crianças invadiram a Oca, não há nada melhor que arte e criança, conexão mágica. O Mam está lúdico, indescritivelmente, lúdico. A Bienal vale não apenas pela arte, mas pela expressão das pessoas que observam a arte. Isso é arte? Feições diversas para uma mesma obra, gostar e não gostar. Repugnância, medo, excitação, identificação. Uma diferente maneira de ver o que poderia ser igual e corriqueiro, mas a arte mexe, remexe, sacode e faz a diferença. O poder da arte questionando política, mundo e gente. Direitos e obrigações. Vivências. Sentimentos. Mudanças. Questionamentos. Muitas respostas. Muitos significados. Muitas dúvidas. A visita à Bienal me faz acreditar em Jean-Luc Godard, que em seu vídeo-arte diz “cultura é regra, arte é exceção”. E pensar, que muito paulistano ainda não visitou a Bienal de Arte de São Paulo, a segunda mais importante e mais antiga bienal do mundo. Ainda dá tempo (ou é mais uma oportunidade que se esvai).

por Fabiana Langaro Loos

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